Prosimetron

Prosimetron

sábado, 7 de novembro de 2009

Paul Valéry - 4

«Profundidade.
«Uma ideia profunda é uma ideia ou uma observação que transforma em profundidade a pergunta ou a situação concreta.
«Se assim não fosse, tratar-se-ia de um efeito de ressonância e estaríamos a penetrar no âmbito do literário.»
Paul Valéry
In: Apontamentos. Arte, literatura, política & outros. Lisboa: Pergaminho, 1994

Onde estamos?

Da Vida e da Morte. Devemos ou não felicitar quem já morreu?

Devemos ou não dar os parabéns a quem já morreu?
Esta questão foi levantada por um comentador que obviamente não comunga da minha ideia.
A morte marca o fim dos sentidos. Se me perguntarem: acreditas que há outra vida para além da morte?
Não sei responder, ... é um mistério. Por isso é que gostamos da vida. Já os egípicios acreditavam e, por isso, se preparavam para outra vida ouvindo a decisão de Osíris.
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Um poeta, um cientista, um músico, um pintor nunca morre! Ora se nunca morre, porque o eternizamos, é porque ele está vivo!
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Partindo da premissa anterior: se não se morre é porque se está vivo, então se se está vivo, porque não felicitar?
Qual é a melhor maneira de felicitar? Não será dar os parabéns?
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Os parabéns, neste caso, dirigidos a Marie Curie são a maneira de agradecer o seu contributo científico ao isolar isotopos radioactivos que estão na génese da teoria da radioactividade.
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A morte bate à porta/
leva o corpo, matéria/
deixa o espírito!

Amanhã na Gulbenkian

Mais um concerto de domingo no Museu Gulbenkian. Entrada livre. É às 12h.

Lá fora - 55 : O regresso da Art nouveau

A Art nouveau influenciou bastante a segunda metade do séc.XX. Do mobiliário à moda, das artes gráficas às capas de discos dos anos 60 numa deriva psicadélica...
O Musée d' Orsay aventurou-se para lá da sua vocação natural, oséc.XIX, e organizou uma exposição que pretende demonstrar as influências acima elencadas.

- Art nouveau revival, Musée d' Orsay, até 4 de Fevereiro de 2010.

Cinenovidades - 71 : Le Concert


Tendo como pano de fundo a Rússia da era Brejnev, esta comédia mostra como a música pode ser sinónimo de liberdade, especialmente quando há um concerto marcado para Paris... O realizador é Radu Mihaileanu e uma das estrelas é a bela Mélanie Laurent.

Coisas do Direito - 13

Já é antiga a controvérsia acerca dos crucifixos nas escolas, designadamente nas salas de aula. Esta semana, após a decisão de terça-feira do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que se pronunciou contra a existência de crucifixos nas salas de aula na sequência de uma queixa proveniente de pais italianos, a questão voltou a ser debatida também entre nós.
Alguns agrupamentos de escolas já manifestaram a intenção de remover os crucifixos, no sentido de prevenir queixas, enquanto que uma das organizações nacionais de pais recomendou que não houvesse precipitação e que se aguardasse pela existência de queixas formais para que os mesmos fossem retirados.
Parece-me a mim que também não será caso de uma massiva retirada dos crucifixos das salas de aulas portuguesas que ainda os tenham, a grande maioria no interior do país como se sabe,
devendo ser tomada tal decisão quando existam efectivamente queixas formais por parte dos encarregados de educação.

E que pensam os demais prosimetronistas desta questão?

Citações - 45 : Guillaume Durand

Achei fenomenal esta resposta dada por Guillaume Durand,homem da comunicação francês, em entrevista recente ( guardei o recorte, mas não assinalei a fonte. Pode ter sido no Le Figaro ou na P.Match, já que os leio de quando em vez, ou em nenhum destes, pelo que ficamos na mesma ) :

" (...) La part d' humanité la plus sincère en moi, les souvenirs les plus importants viennent des épreuves plus que des soirées au champagne qui se confondent toutes. Notamment parce que dans les coups durs, on est seul. La condition humaine, c' est la solitude. "

Versos de Harrison, Dean Johnson e a polémica

Tal como acontece como muitos outros músicos, escritores e poetas, George Harrison escrevinhava versos onde calhava, nos mais variados papeis. No final dos anos 60, chegou às mãos do seu biógrafo, Hunter Davies, um fragmento com alguns versos. Foram estes versos que agora Dean Johnson completou, sendo o resultado final esta canção: Silence ( Is its own reply ). Canção envolta em polémica, com grandes ataques dos beatlómanos mais puristas. Um episódio que relança a velha questão de saber, desde logo no caso de músicos, que destino deve ser dado aos inéditos, especialmente quando se trata de meros fragmentos.

ONDE ME APETECIA ESTAR - 25 : Grândola

Ao contrário do que é habitual nestes meus desejos de passeio, este fim de semana contentava-me com um destino luso: uma visita a Grândola, à 3ª Feira do Chocolate que decorre até amanhã no Parque de Feiras e Exposições da cidade. Além do chocolate, disponível sob todas as suas formas ( fondue, crepes, bombons, bolos, licor e até vodka ), há também uma mostra gastronómica para refeições e animação musical. E no centro do evento está naturalmente o Museu do Chocolate de Grândola, onde são exibidas as criações de mestres chocolateiros.

O problema da habitação...

Este palacete construído no séc.XVII, local de nascimento da marquesa de Sévigné, é o número 1 da da famosa Place des Vosges, no Marais, Paris. Tem sido notícia nos últimos dias por ter sido ocupado pelo grupo Jeudi Noir, nele residindo agora uma vintena de jovens estudantes, trabalhadores precários e desempregados. E foi ocupado porque estava vazio, desabitado aliás desde 1963 quando foi comprado por Beatrice Cottin.
São agora estes jovens que vivem numa pequena parte dos dois mil metros quadrados de quartos e salões deste belo palacete do Marais.
Os jovens queixam-se dos elevados preços das rendas de Paris ( pode ver-se no sítio deles anúncios de apartamentos para arrendar em Paris, em que se chega a pedir 650 euros por 14m2 ! ), e do facto que a crise económica os lançou para o desemprego e para as ruas.
A proprietária, de 87 anos, vive num lar e está sob tutela do Estado, alegando os seus advogados que ela realmente tem imóveis mas não tem liquidez para os restaurar.
Os jovens responderam alegando que uma parte do palácio está habitável, podendo ser convertida numa dezena de apartamentos, e fizeram umas "visitas guiadas" para que se pudesse ver o estado do imóvel.
Obviamente, já há queixas em tribunal, mas os ocupantes têm um grande trunfo a seu favor: a Loi de l' hiver, que vigora de 2 de Novembro a 16 de Março e que impede o despejo de inquilinos durante esse período...
Este é um problema que tanto aflige Paris como Lisboa: centenas ou mesmo milhares de casas na cidade de Lisboa ( nem é preciso procurar muito, há prédios inteiros por todo o lado) estão vazias, enquanto que os jovens são empurrados para periferias cada vez mais distantes ou pagam somas consideráveis por um quarto minúsculo.
O que me surpreende é não existirem mais ocupações em Lisboa.

Segunda e terça no Correio Velho

Decorrerá nas próximas segunda e terça-feira a terceira parte do leilão da biblioteca António Capucho. São 645 lotes, com obras dos sécs.XVI a XX e manuscritos de Ramalho Ortigão, José Régio ( este avaliado em 7000 euros ) e Eliezar Kamenezky, entre outros.
É no Palácio do Correio Velho, Lisboa.

Joni Mitchell : 1943

A 7 de Novembro de 1943, na província de Saskatchewan, Canadá, nascia Joni Mitchell, compositora, cantora e pintora. Ainda está no activo, embora com grandes intervalos, tendo lançado o mais recente álbum em 2007.

Detalhes


A vida é feita de detalhes... e por vezes pequenos detalhes (a que muitas vezes não ligamos) revelam a personalidade de cada um. As jóias constituem um desses detalhes!
Fica aqui uma Madalena que se quer desprender dos atavios humanos.

(pormenor)

Imagens - Caravaggio: Madalena (1596-97)
Itália, Roma, Galleria Doria-Pamphili

Ésquilo desceu das nuvens, nas asas de um relâmpago!


"Está hoje um dia de chuva tristíssima. Sou irmão destes dias pluviosos e cinzentos! O Henrique não imagina a intensidade da minha tristeza, em certos dias infernais! A minha sensibilidade nunca se adaptou a este mundo. Nem se adapta! Para que nascem as criaturas que não são deste mundo? Para fugirem dele violentamente? Vivemos num pesadelo! E não há modo de acordar! sinto-me bruto e desolado, querido Henrique! Paz aos brutos e aos mortos! Eu creio que nem os mortos dormem em paz! Os vivos não os deixam dormir! A tragédia cá de baixo continua-se lá acima! Ésquilo desceu das nuvens, nas asas de um relâmpago! "

(...) Joaquim [Teixeira de Pascoaes]
14 de Outubro de 1924

Uma Amizade, Cartas de Pascoaes a Anrique Paço D'Arcos, Lisboa: Vega, 1993, (1ª edição), (Selecção e pref. Maria do Carmo Paço D’Arcos), p. 30

Entalados - 5


Escultura assinada A. Cruz.
Av. de Roma, 36

Bellamy de Claude Chabrol

Está a decorrer a Festa do Cinema Francês no Gil Vicente, em Coimbra. Fui ver o filme Bellamy, realizado por Chabrol. Paul Bellamy, Gérard Depardieu, é um comissário de polícia que ao tentar desvendar um crime vai focando: as relações entre as pessoas cruzadando-as com a sua própria história de família. Gostei do filme, embora, tenha achado que Depardieu interpretou uma personagem pouco vincada.

Minnie The Moocher - Cab Calloway

Gosto muito desta música de Cab Calloway, decidi colocar esta versão!

In memoriam: Marie Curie!

Marie Curie nasceu a 7 Novembro de 1867 , em Varsóvia, Polónia. Parabéns!
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Marie Curie foi uma notável cientista, pioneira nos estudos da radioactividade, sendo galardoada pela Real Academia Sueca das Ciências que a distinguiu duas vezes com o prémio Nobel, da Física, em 1903 e da Química em 1911.
Marie Skłodowska–Curie
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Pierre e Marie Curie, no seu laboratório em Paris, antes 1907

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Os meus franceses - 78


Reda Caire (1905-1963) nasceu no Cairo, filho de um belga, e faleceu em França. Ao longo da sua carreira artística entrou em numerosas operetas.

O céu está cinzento, prometendo chuva. Mas espero que se aguente. Jad, envia um fax! (De alguma coisa deve servir tanta beatice!)

Paul Valéry - 3


«A ideia poética é aquela que usada na prosa continua a reclamar o verso.»
Paul Valéry
In: Apontamentos. Arte, literatura, política & outros. Lisboa: Pergaminho, 1994

Na "Pele" de Vítor Pinhão




Chegou-me hoje por correio um convite para mais uma exposição de Vítor Pinhão. Confesso que não conheço o trabalho deste pintor (45 anos) de quem se diz ter uma intervenção polémica em toda a sua obra. "Pele" é o título desta mostra que inaugura amanhã na Trema - Arte Contemporânea, na Rua do Jasmim, 30, junto ao Jardim do Príncipe Real, das 16 às 23 horas. As reproduções impressas no convite (que não são estas) revelam figuras humanas em muitos casos dominadas por animais, num jogo de subjugação que faz lembrar a obra de George Orwell: O Triunfo dos Porcos. Entre bovinos, suínos, gatos, coelhos, galinhas ou macacos, as composições de Vítor Pinhão invocam ainda - com as devidas ressalvas - algum do trabalho de Paula Rêgo. Uma exposição a não perder.

Consolação



CONSOLAÇÃO

Nas ruas da cidade caminha o meu amor. Pouco importa onde vai no tempo dividido. Já não é meu amor, todos podem falar-lhe. Ele já não se recorda. Quem de facto o amou?

Procura o seu igual no voto dos olhares. O espaço que percorre é a minha fidelidade. Ele desenha a esperança e ligeiro despede-a. Ele é preponderante sem tomar parte em nada.

Vivo no seu abismo como um feliz destroço. Sem que ele o saiba, a minha solidão é o seu tesouro. No grande meridiano onde se inscreve o seu curso é a minha liberdade que o escava.

Nas ruas da cidade caminha o meu amor. Pouco importa onde vai no tempo dividido. Já não é o meu amor, todos podem falar-lhe. Ele já não se recorda. Quem de facto o amou e de longe o ilumina para que ele não caia?


René Char

In: Este fanático das nuvens / trad. Yvette K. Centeno. Lisboa: Cotovia, 1995, p. 93

Também ontem agarrei num livro de René Char... coisa que o Prosimetron faz... gostei deste poema. Aqui fica!


(imagem: Lisboa, Rua Garrett, 2 de Novembro de 2009, 19:10 h)

Maior não há ( por enquanto... )

Com 17,5m de diâmetro, esta é maior reprodução existente até à data do célebre quadro de Leonardo. É em Wrexham, no País de Gales. ( foto: Phil Noble/Reuters )

Francisco de Vasconcelos no Clube Literário do Porto

Homenagem a Francisco de Vasconcelos, de 7 a 15 de Novembro, no Clube Literário do Porto





Homenagem a Francisco de Vasconcelos

Dia 7 Sábado (FADO)

Piano bar

17h00

Abertura da semana de homenagem a Francisco de Vasconcelos

com entidades oficiais, convidados e amigos.

Abertura da mostra regional: "Sabrosa Terra de Magalhães e de Cultura. Miguel Torga, Aires Torres e Francisco de Vasconcelos - Raízes Comuns"

Livro de Honra - Descerramento e Inscrição

Porto de Honra

Galeria Inauguração da Exposição de Fotografia "À Procura de Um Fado", de Otília da Silva, no âmbito da homenagem a Francisco de Vasconcelos

Cave

Projecção do Filme documentário "À Procura de Um Fado", de Jorge Campos, no âmbito da homenagem a Francisco de Vasconcelos

Exposição e filme estarão patentes ao público até 15 de Novembro

Dia 8 Domingo (RAÍZES)

Auditório

Francisco de Vasconcelos e as suas raízes

Mostra regional: "Sabrosa Terra de Magalhães e de Cultura. Miguel Torga, Aires Torres e Francisco de Vasconcelos - Raízes Comuns".

Colaboração da C.M. de Sabrosa

Dia 9 Segunda-feira (ARTE/ ESTUDO)

Auditório

15h00

Aula aberta: «Francisco de Vasconcelos e Fotografia».

"à procura de um Fado" de Olívia Da Silva

Exposição foto biográfica (concepção e estudos)

Organização: ESMAE - DAI Curso de Vídeo

Participação do homenageado

Dia 10 Terça-feira (SOCIEDADE/ ESTUDO)

Auditório

21h30

A Vida Comunitária e a procura da Identidade: a acção dos agentes culturais na reconstrução da consciência social

Conferencista: Aurélio Lopes (Antropólogo)

Dia 11 Quarta-feira (ARTE/ ESTUDO)

Auditório

15h00

Aula aberta " Grande Noite do Fado Académico e Hora Torguiana "

Produção gráfica institucional do evento e do CD (Concepção e estudos)

Organização: ESAD

Participação do homenageado

Dia 12 Quinta-feira (Tradição/ Obra)

Piano bar

21h30

Lançamento do CD duplo «Coimbra, Fado e eu» - Obra musical completa de Francisco de Vasconcelos

Sessão de Fados

Dia 13 Sexta-feira (Arte/ Estudo)

Piano bar

15h00

Aula aberta: «Francisco de Vasconcelos e o audiovisual».

"à procura de um Fado" de Jorge Campos

Filme biográfico (concepção e estudos)

Organização: ESMAE - DAI Curso de Vídeo

Participação do homenageado

Dia 14 Sábado (Cultura/ Obra)

Piano bar

16h00

Lançamento do livro de poesia

"Poemas brancos" de Francisco de Vasconcelos

Declamação de poesia e guitarradas pelo grupo "In Illo Tempore"

Dia 15 Domingo (Sociedade/ Mobilidade Sem Limites)

Dia Nacional da Língua Gestual

Piano Bar

16h00

"Silêncio Fado Silêncio" - Sessão de fado para surdos

Participação conjunta do grupo de fados do ISEP e da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa

De 2ª a 6ª-feira

Galeria

Cave

15h30

Visitas de estudo às exposições.

O homenageado, Francisco de Vasconcelos, recebe alunos das suas antigas escolas e de escolas convidadas com a sua bagagem de Vida, Fado, Cultura e Tradição .


Clube Literário do Porto
Rua Nova da Alfândega, n.º 22
4050-430 Porto
T. 222 089 228
Fax. 222 089 230
Email: clubeliterario@fla.pt
URL: www.clubeliterariodoporto.co.pt

A Fé

Realmente a é muito difícil de explicar e de compreender. Ou se tem (e se se tem sabe-se o que é e não necessita de explicação) ou não se tem (e neste caso por mais que se tente explicar nunca se consegue fazer compreender, porque o "racional" sobrepõe-se-lhe). E é a Fé, ou melhor a falta de Fé, que faz com que um dia se vá à missa e no outro se esqueçam os ensinamentos dessa mesma Fé.

Vem este meu filosofar - que quase parece uma piada de La Palisse (parece que o mais correcto até seria La Palice) - a propósito de uma conversa que tive nos últimos dias sobre o episódio Bíblico de Abraão e o sacrifício de Isaac que Luís Barata hoje, recordou, cientificamente.


(Caravaggio, 1601-02, Itália, Florença, Galleria Degli Uffizi)

Lia a um estudante de Teologia o texto que vou transcrever e transcrevo (sem fazer qualquer outra alteração que não seja abrir parágrafos, como faço em todas as transcrições)

[...] Já as pálpebras tinham começado a pesar-lhe quando uma voz junevil, de rapaz, o fez sobressaltar,

Ó pai, chamou o moço, e logo uma voz, de adulto de certa idade, perguntou, Que queres tu, isaac,
Levamos aqui o fogo e a lenha, mas onde está a vítima para o sacrifício, e o pai respondeu, O senhor há-de prover, o senhor há-de encontrar a vítima para o sacrifício.
E continuaram a subir a encosta.
[...]
Chegando assim ao lugar de que o senhor lhe tinha falado, abraão construiu um altar e acomodou a lenha por cima dele. Depois atou o filho e colocou-o no altar, deitado sobre a lenha. Acto contínuo, empunhou a faca para sacificar o pobre rapaz e já se dispunha a corta-lhe a garganta quando sentiu que alguém lhe segurava o braço, ao mesmo tempo que uma voz gritava,
Que vai você fazer, velho malvado, matar o seu próprio filho, queimá-lo, é outra vez a mesma história, começa-se por um cordeiro e acaba-se por assassinar aquele a quem mais deveria amar,
Foi o senhor que o ordenou, foi o senhor que o ordenou, debatia-se abraão,
Cale-se, ou quem o mata aqui sou eu, desate já o rapaz, ajoelhe e peça-lhe perdão,
Quem é você,
Sou caim, sou o anjo que salvou a vida a isaac.
Não, não era certo, caim não é nenhum anjo, anjo é este que acabou de pousar com um grande ruído de asas e que começou a declamar como um actor que tivesse ouvido finalmente a sua deixa,
Não levantes a mão contra o menino, não lhe faças nenhum mal, pois já vejo que és obediente ao senhor, disposto, por amor dele, a não poupar nem sequer o teu filho único,
Chegas tarde, disse caim, se isaac não está morto foi porque eu o impedi.
O anjo fez cara de contrição, Sinto muito ter chegado atrasado, mas a culpa não foi minha, quando vinha para cá surgiu-me um problema mecânico na asa direita, não sincronizava com a esquerda, o resultado foram contínuas mudanças de rumo que me desorientavam, na verdade vi-me em papos-de-aranha para chegar aqui, ainda por cima não me tinham explicado bem qual destes montes era o lugar do sacrifício, se cá cheguei foi por um milagre do senhor,
Tarde, disse caim,
Vale mais tarde que nunca, respondeu o anjo com prosápia, como se tivesse acabado de enunciar uma verdade primeira,
Enganas-te, nunca não é o contrário de tarde, o contrário de tarde é demasiado tarde, respondeu caim.

Responde-me o jovem estudante de Teologia: Veja como Deus foi na mesma providente! Não estava lá o anjo, estava lá Caim... Deus é sempre providente!

(Nada do que acabo de narrar foi ficção. O texto é tirado das páginas 83-84 da obra de José Saramago, Caim, 3.ª ed., Lisboa, 2009. O jovem de Teologia existe e tem como nome Emanuel.
O vitral encontra-se na Catedral Melquita (Católica-Grega, rito bizantino) de Boston (Roslindale), Massachusetts, USA.).

Auto-retrato(s) - 36

Jean-Honoré Fragonard - Inspiration. Óleo sobre tela, 1769. Paris, Louvre.
Jean-Honoré Fragonard (1732-1806), - Auto-retrato. Óleo sobre tela, 1760. Grasse, Musée Fragonard.
Perdoem-me este "dois em um" mas achei que seria interessante juntar estes dois auto-retratos de Fragonard.

Crise? Qual crise?



A "lucidez" de um nosso compatriota. Esqueceu-se foi da radiodifusão...e já agora dos jornais.

Quotidianos - 24


Paul Cornoyer (1864-1923) - Plaza after rain, New York
Óleo sobre tela, 1910
Missouri, The Saint Louis Art Museum

De Cioran - 2

Au Zoo. - Toutes ces bêtes ont une ténue décente, hormis les singes. On sent que l' homme n' est pas loin.

- E.M. Cioran, Ébauches de vertige, p.25.

Príncipe Real Live

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Os lojistas da Rua D. Pedro V, Príncipe Real, Ruas Cecílio de Sousa e Escola Politécnica esmeraram-se na decoração das suas lojas e alguns apresentam exposições especiais, encontrando-se abertos até até às 23h00 de 8 de Novembro. Estão previstos recitais de ópera, hoje e amanhã, às 19h15 nas varandas do Prédio Laranja, na Rua D. Pedro V, e da Uzina, Jardim do Príncipe Real, para além de actuações de artistas do Chapitô.

Uma nova visão sobre o sacrifício de Isaac

The sacrifice of Isaac is one of the most tragic episodes of the Hebrew Bible. After miraculously granting a son to a centenarian and to a hitherto sterile 90-year-old woman, the capricious Deity orders Abraham to kill his offspring. Abraham unhesitatingly obeys without revealing the divine command to his wife or his son.


Geza Vermes
October 2009


De Agustina - 3


A desconfiança é a única vantagem do povo sobre as minorias que o conduzem.
- Agustina Bessa-Luís, in Crónica do Cruzado Osb, p.31.
( A imagem é um fotograma de Nasci adulta e morrerei criança, documentário com fotografia e direcção de Jorge Afonso. Infelizmente, um título absolutamente premonitório.)

Sonetos de Bocage

A folhear um livro de Sonetos de Bocage encontrei este que me fez sorrir. O Inverno ainda não chegou e é uma época que gosto. Hoje queria ver muitas flores por isso fui buscar estas.

Já se afastou de nós o Inverno agreste,
Envolto nos seus húmidos vapores;
A fértil Primavera, a mãe das flores
O prado ameno de boninas veste.

Varrendo os ares, o sutil Nordeste
Os torna azuis; as aves de mil cores
Adejam entre Zéfiros e Amores,
E toma o fresco Tejo a cor celeste.

Vem, ó Marília, vem lograr comigo
Destes alegres campos a beleza,
Destas copadas árvores o abrigo.

Deixa louvar da corte a vã grandeza:
Quando me agrada mais estar contigo,
Notando as perfeições da Natureza!

Sonetos de Bocage, apresentação de Hernâni Cidade, Lisboa: Livros Unibolso, s.d., p.56

Bailarinas 2.

A bailarina de Matisse tem a graciosidade do fauvismo, nome por que Louis Vauxcelles apelidou os pintores que expuseram no Salão de Outono, de 1905, em Paris.
A utilização das cores para dividir a tela em vários planos e o uso das cores puras estão representadas na bailarina. Henri Matisse referiu que procurava na sua pintura:
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"uma arte do equilíbrio, da pureza e da serenidade, destituída de temas perturbadores ou deprimentes".
x
Henri Matisse, Bailarina, c. 1927

Óleo sobre tela, colecção de Otto Krebs, Holzdorf
x
MILLER, Joseph Émile. O Fauvismo, São Paulo, Verbo, Ed. da Universidade de São Paulo, 1976.

Problemas Antropológicos - Fernando Pessoa

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"Se tudo fosse mau a nossa adaptação a esse tudo - não
faria dele amanhã um tudo bom, um absoluto bom".
x
[1908?]
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Fernando Pessoa, Textos Filosóficos, Lisboa: Edições Ática, 1968, Vol.I, p. 233 (com prefácio de António de Pina Coelho)

Lua de Novembro sobre Lisboa


A lua brilhava mas as nuvens não deixavam passar a sua Luz!
A Igreja da Graça tentava iluminar mais do que a própria Lua.
Conflitos de uma noite Lisboeta!

Auto-retrato(s) - 35


James Montgomery Flagg (1877-1960) - [Cartaz da 1.ª Guerra Mundial]
Litografia, 1917
A versão do Tio Sam é um auto-retrato.

Entalados - 4


Av. de Roma, 42.

In Memoriam: Sofia de Mello Breyner Andresen!

Sofia de Mello Breyner Andresen nasceu no Porto a 6 de Novembro de 1919. Em sua memória escolhi este poema: Retrato de uma Princesa desconhecida.
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Sophia de Mello Breyner Andresen
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Retrato de uma princesa desconhecida
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Para que ela tivesse um pescoço tão fino
Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule
Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos
Para que a sua espinha fosse tão direita
E ela usasse a cabeça tão erguida
Com uma tão simples claridade sobre a testa
Foram necessárias sucessivas gerações de escravos
De corpo dobrado e grossas mãos pacientes
Servindo sucessivas gerações de príncipes
Ainda um pouco toscos e grosseiros
Ávidos cruéis e fraudulentos
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Foi um imenso desperdiçar de gente
Para que ela fosse aquela perfeição
Solitária exilada sem destino
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Sophia de Mello Breyner Andresen
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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Na Primavera de Pedro Rapola

Georges de La Tour / René Char

Agradeço a Alberto Soares os comentários que fez na citação de Paul Valéry e que me levaram a procurar «Madeleine aux deux flammes», bem como o poema «Les trois soeurs» de René Char. Encontrei então ainda «Madeleine à la veilleuse» e também um texto de Char sobre este último quadro. Mais uns quadros semelhantes.


Georges de La Tour (1593-1652) - Madeleine aux deus flammes
Óleo sobre tela, s.d.
Nova Iorque, The Metropolitan Museum of Art


LES TROIS SOEURS

Mon amour à la robe de phare bleu
je baise la fièvre de ton visage
où couche la lumière qui jouit en secret.

J'aime et je sanglote. Je suis vivant
et c'est ton cœur cette Etoile du Matin
à la durée victorieuse qui rougit avant
de rompre le combat des Constellations.

Hors de toi que ma chair devienne la voile
qui répugne au vent.

I

Dans l'urne des temps secondaires
L'enfant à naître était de craie.
La marche fourchue des saisons

La connaissance divisible
Pressait d'averses le printemps.
Un aromate de pays
Prolongeait la fleur apparue.
Abritait d'herbe l'inconnu.

Communication qu'on outrage,
Ecorce ou givre déposés ;
L'air investit, le sang attise ;
L'œil fait mystère du baiser.

Donnant vie à la route ouverte,
Le tourbillon vint aux genoux ;
Et cet élan, le lit des larmes
S'en emplit d'un seul battement

II

La seconde crie et s'évade
De l'abeille ambiante et du tilleul vermeil.
Elle est un jour de vent perpétuel,
Le dé bleu du combat, le guetteur qui sourit
Quand sa lyre profère : « Ce que je veux, sera ».

C'est l'heure de se taire,
De devenir la tour
Que l'avenir convoite.

Le chasseur de soi fuit sa maison fragile :
Son gibier le suis n'ayant plus peur.

Leur clarté est si haute, leur santé si nouvelle,
Que ces deux qui s'en vont sans rien signifier
Ne sentent pas les sœurs les ramener à elles
D'un long bâillon de cendre aux forêts blanches.

III

Cet enfant sur ton épaule
Est ta chance et ton fardeau.
Terre en quoi l'orchidée brûle,
Ne le fatiguez pas de vous.

Restez fleur et frontière.
Restez manne et serpent ;
Ce que la chimère accumule
Bientôt délaisse le refuge.

Meurent les yeux singuliers
Et la parole qui découvre.
La plaie qui rampe au miroir
Est maîtresse des deux bouges.

Violente l'épaule s'entrouvre ;
Muet apparaît le volcan.
Terre sur quoi l'olivier brille.
Tout s'évanouit en passage.

René Char
(retirado da net)


Georges de La Tour (1593-1652) - La Madeleine à la Veilleuse
Óleo sobre tela, 1640-1645
Paris, Museu do Louvre


MADALENA À LUZ DA LAMPARINA
de Georges de La Tour

Queria hoje que a erva fosse branca para pisar os sinais visíveis do vosso sofrimento: não veria sob a vossa mão tão jovem a forma dura, sem reboco, da morte. Num dia discricionário, outros, apesar de menos ávidos do que eu, hão-de retirar-vos a camisa de estopa, ocupar a vossa alcova. Mas, quando partirem, hão-de esquecer-se de apagar a lamparina e um pouco de óleo derramar-se-á pelo punhal da labareda sobre a impossível solução.

René Char
In: Furor e mistério / trad. Margarida Vale de Gato. Lisboa: Relógio d'Água, 2000, p. 387

Uma monarquia protestante

Carlos V e Martinho Lutero encontraram-se e confrontaram-se na Dieta de Worms em 1521. O recente post de Luís Barata e a bela ilustração deram conta desta entrevista. Outra figura histórica presenciou a Dieta, o jovem príncipe herdeiro da Dinamarca, Christian. Impressionado pela visão de Lutero, torna-se num defensor da reforma protestante.
Frederico I, pai de Christian, sobe ao trono dinamarquês poucos anos depois, em 1523. Promete ao Reichsrat (Conselho) combater as ideias luteranas, todavia, a reforma “propaga-se” rapidamente na Dinamarca via comerciantes e pastores protestantes. A receptividade da população assenta num descontentamento generalizado em relação ao poder católico instituído. A fragilização da igreja e seus bispos, membros do Reichsrat, não é de todo inoportuna ao soberano que vê a possibilidade de controlar as ambições do clero. Christian empenha-se pessoalmente a favor da nova causa no distrito de Hadersleben (Schleswig), ao impor a todos os sacerdotes a conversão.


O Rat (Conselho), ainda maioritariamente católico, opõe-se assim à eleição de Christian ao trono em 1533 e suspende por um ano a escolha do sucessor de Friedrich, falecido a 1 de Abril desse ano, na expectativa de poder entretanto nomear outro candidato, favorável ao catolicismo. No entanto, o protestantismo enraíza-se no povo dinamarquês. Copenhaga e Malmö (pertença da Dinamarca na época) revoltam-se conra o Conselho juntamente com a cidade luterana de Lübeck, e os lavradores enfrentam a aristocracia, acusada de exigir impostos insuportáveis.
Christian aproveita a vaga de protesto e combate os rebeldes nas cidades e províncias. Em troca, exige do Reichsrat a sua eleição como rei. A nobreza e o clero, salvos da rebeldia, deparam-se com um novo inimigo: o próprio Christian. Em Abril de 1536, os bispos católicos são encarcerados, os bens da igreja confiscados o que triplica o património da coroa.

Christian III recorre à ajuda de Johannes Bugenhagen, com vista a consolidar o protestantismo no seu país. Bugenhagen, amigo de Lutero, é incumbido de organizar a coroação do novo monarca o que constitui um verdadeiro desafio: como é do conhecimento geral, era entendimento da época que a coroação conferia a legitimação divina, e a igreja intervinha em intercessão entre Deus e o rei. Em contrapartida, defendia a nova visão de Lutero uma segregação rigorosa entre igreja e questões profanas. Bugenhagen, não dominando a língua dinamarquesa, celebra a missa de coroação em alemão e não em latim. A cerimónia culmina no juramento de Christian de respeitar e seguir a nova doutrina.
Nasce assim a primeira monarquia protestante.
Imagens: Frederiksborg (Copenhaga); Christian III (retrato da autoria de Jost Verheiden); Johannes Bugenhagen

Amanhã na Gulbenkian

James Watson, um dos génios científicos do séc.XX, laureado Nobel por ter sido um dos responsáveis pela descoberta da estrutura do ADN, profere amanhã uma conferência na Fundação Gulbenkian : Curar o cancro hoje, não amanhã. É uma iniciativa da Fundação Champalimaud.

- Fund.Gulbenkian, 16h.

Sempre a aprender - 6 : Curiosidade toponímica

Ao ler uma notícia sobre um novo espaço nocturno lisboeta, a Domus, situada numa antiga fábrica de electricidade industrial, sou surpreendido com a respectiva morada: R. Maria Isabel Saint-Léger, 12. Desconhecia este topónimo. No entanto, após pesquisa, descobri que afinal conhecia bem a senhora que deu o nome à rua. Trata-se da primeira Marquesa de Rio Maior, dama de D.Maria Pia, cujas memórias foram publicadas em 1930 por Branca de Gonta Colaço e recentemente reeditadas. Mas não é pela ligação palatina que a rua assim se chama: é que Maria Isabel de Saint-Léger foi uma das fundadoras das Cozinhas Económicas.